quinta-feira, 31 de agosto de 2017

A "razão de ser" da Oceanografia por Satélites

Por Gustavo Prouvot Ortiz

Originalmente publicado em: https://www.linkedin.com/pulse/razão-de-ser-da-oceanografia-por-satélites-gustavo-prouvot-ortiz

DSA/CPTEC/INPE (data provided by KNMI)

    Assim como o pioneiro Iuri Gagarin ficou extasiado ao observar nosso lindo planeta e exclamar que "A Terra é azul", atualmente os satélites científicos permitem que nós tenhamos momentos de êxtase diariamente. Isto é possível pois sensores em órbita na Terra são capazes de observar e medir diferentes variáveis e processos ambientais. 

   O Sensoriamento Remoto por satélites permite a observação de grandes regiões praticamente no mesmo instante, sendo possível avaliar a extensão espacial de fenômenos normalmente pesquisados localmente, com auxílio de equipamentos de campo. A Oceanografia beneficiou-se com o advento dos satélites a partir do final da década de 70, permitindo uma visão e entendimento sem precedentes dos processos oceanográficos existentes. 

   Diversas variáveis primárias medidas pelos satélites, como radiância, temperatura de brilho, rugosidade superficial e topografia dinâmica são utilizadas na Oceanografia por Satélites para a estimativa de variáveis importantes como temperatura superficial, concentração de clorofila-a, velocidade geostrófica, altura de ondas, campo de ventos superficiais, entre outros. Desta forma, o Sensoriamento Remoto tornou-se essencial para a Oceanografia moderna, provendo uma grande extensão espacial das observações às variáveis oceanográficas tradicionalmente estudadas por navios, bóias e sensores isolados.

   Atualmente, além da utilização dos sensores de campo para calibração e validação dos dados de satélites, há a tendência de sinergia dos dados de diferentes fontes, aproveitando o que cada tipo de sensor pode prover de melhor. Os crescentes avanços na capacidade computacional e gráfica dos grandes centros de Observação da Terra permitem, cada vez mais, que nós tenhamos momentos de êxtase como Iuri Gagarin, porém dizendo que "A Terra é Azul - e tem um monte de coisa acontecendo nela!".

   Este texto foi motivado por um post feito pelo Ocean Biology Distributed Active Archive Center (OB.DAAC) da NASA, que indica de forma simples "a razão de ser da Oceanografia por Satélite"



“The patchiness exhibited by phytoplankton communities around New Zealand in the image provides the raison d'être for satellite remote sensing of ocean color; a whole fleet of ships, drifters, gliders, and buoys could not capture this variability before it morphed into a new pattern.”

Saudações oceanográficas!



Gustavo já publicou outro post no Bate-papo com Netuno, leia aqui




Sobre Gustavo Prouvot Ortiz

Sou oceanógrafo com experiência em sensoriamento remoto, geologia marinha, Lei do Mar e geopolítica. Vejo o oceanógrafo (bem formado) como um "naturalista moderno", capaz de observar e descrever processos com abordagem multidisciplinar e desempenhar papel relevante em diversos setores da sociedade. Tenho paixão pela divulgação científica e, como pai, creio que somos responsáveis por desenvolver o senso crítico nos pequenos e fazê-los perceber seu papel em nosso complexo planeta.

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

17º Congresso Latino-Americano de Ciências do Mar




O 17o Congresso Latino-Americano de Ciências do Mar (Colacmar) ocorrerá esse ano no Brasil, de 13 a 17 de novembro.


Não percam essa oportunidade de participar de um evento internacional em casa!


Informações: http://www.colacmar2017.com

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

O que é Maricultura?

Por Gabrielle Souza 

Você já ouviu o termo “Maricultura”? Sabe qual a importância dessa prática? No Descomplicando Netuno de hoje vamos falar sobre isso!


   Você já deve ter escutado falar sobre a criação de algas e animais aquáticos em viveiros, não é mesmo?! Esta prática é conhecida como aquicultura, que nada mais é do que criar condições parcial ou totalmente controladas para cultivar esses organismos. Para ser considerada uma atividade de aquicultura, segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), são necessários três requisitos:
  • que o organismo possua habitat predominantemente aquático em algum estágio de seu desenvolvimento;
  • a existência de manejo e produção;
  • a existência de um proprietário da criação (não é um bem coletivo).


   A aquicultura é um termo muito amplo e engloba todos os organismos que vivem em ambiente aquático. Por isso, para o cultivo e criação dos organismos marinhos ou estuarinos foi criado o termo maricultura. 

   A maricultura pode ser subdividida de acordo com o tipo de organismo cultivado, como por exemplo: peixes (piscicultura), crustáceos (carcinicultura - que se restringe somente a camarões no Brasil), moluscos (malacocultura) e algas (algicultura).

   Você deve estar se perguntando, “como estes organismos são criados e obtidos?” Geralmente os organismos são obtidos no ambiente natural em seu estágio jovem, porém também podem ser produzidos em laboratório, incluindo a reprodução e criação de larvas, conhecida como larvicultura.

   Depois da obtenção da forma jovem, os organismos são cultivados em viveiros escavados, tanques ou no mar, comumente em ambientes costeiros abrigados como baías, golfos, entre outros. Os viveiros mais utilizadas para criar este animais no mar são: gaiolas, longlines, balsas e tanques-rede.

Figura A: Longlines (ou longa linha). Fonte
Figura B: Lanterna com cinco andares, utilizados para criação de moluscos. Fonte
Figura C: Gaiola utilizada para criação de peixes. Fonte

      Para cada tipo de cultivo utiliza-se condições físico-químicas da água adequadas e controladas, como por exemplo temperatura, iluminação, salinidade, concentração de oxigênio dissolvido, amônia e nitrito.

  Na tabela abaixo observa-se a produção em toneladas da maricultura brasileira entre os anos de 2008 a 2010, onde as práticas mais comuns são carcinicultura e malacocultura. No país a maricultura é praticada em todos os estados costeiros e está, a cada dia mais, se estabelecendo como atividade produtora do pescado, sendo uma fonte de renda para diversas famílias, que garantem o sustento com essa prática. São destaques a região sul, em Santa Catarina, com a produção de mexilhões, ostras e vieiras.

Tabela Adaptada de Castello & Krug, 2015

    A maricultura é vista com grande importância na produção de alimentos e para outros ramos da indústria. É uma atividade de potencial crescimento, podendo atender o déficit entre demanda e oferta dos produtos pesqueiros. Porém, como qualquer outra intervenção humana na natureza, a maricultura tem seus pontos negativos e positivos. Ao mesmo tempo que é uma atividade que não sobrecarrega os estoques pesqueiros naturais, que gera fonte a comunidades tradicionais, pode causar desmatamento em áreas costeiras, a contaminação das águas, a introdução de espécies exóticas (que não são nativas) entre outros problemas. Assim sendo, faz-se necessário buscar uma maricultura cada vez mais sustentável, que minimize os impactos ambientais, e beneficie a sociedade e a economia local. Falaremos mais sobre isso em outro post, aguardem!


Para saber mais:




Referências

CASTELLO, Jorge Pablo; KRUG, Luíz Carlos. Introdução às Ciências do Mar. Pelotas: Textos, 2015. 602 p.


quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Para onde foi a água do mar?

Por Gustavo Prouvot Ortiz




(adaptação da foto de Léo Saballa Jr/RBS TV)

   Recentemente foi muito comentado na imprensa e redes sociais o acentuado recuo do mar observado nos estados do Sul e Sudeste, nos dias 12 e 13 de agosto. Muitas dúvidas surgiram a respeito:

Qual será o motivo desse fenômeno? 
Será que é um tsunami? 
Já aconteceu outras vezes?


Para entender: o nível do mar é influenciado basicamente por:  

Nível Eustático + Maré Astronômica + Efeitos Meteorológicos      

  1. Nível Eustático: nível regional, associado a longos ciclos climáticos maiores que 1.000 anos     
  2. Maré Astronômica: forçada pela dinâmica gravitacional da Terra e outros corpos celestes (Sol, Lua...) - ciclos entre 12h e 24h (saiba mais aqui)     
  3. Efeitos Meteorológicos: também chamados de "maré meteorológica", são efeitos forçados por incidência de vento local ou instabilidades na atmosfera - duram até poucos dias  

Explicação 

   O recente caso chamou a atenção pelo baixíssimo nível do mar, que resultou no recuo da linha d'água de mais de 50m em alguns locais mais planos. 

   Dentre as três opções anteriores, podemos, é claro, descartar a (1) pela escala temporal. A opção (2) também pode ser descartada como principal forçante, pois nos dias 12 e 13 a Lua estava indo para a fase minguante, que está relacionada às marés de quadratura (baixa amplitude). 

   Sobra, então, a opção (3) Efeitos Meteorológicos. Mas como eles poderiam gerar tal fenômeno? Vejamos: 

   O escaterômetro é um sensor a bordo de satélites capaz de medir a velocidade e direção do vento na superfície do oceano. Na manhã do dia 12 o sensor a bordo do MetOp-A registrou fortes ventos vindos de NE ao largo dos estados do Sul e Sudeste. Este padrão de ventos já vinha sendo observado há alguns dias na região.








Esta configuração de vento paralelo à costa gera o processo oceanográfico chamado de transporte de Ekman:
  Através de um complexo equilíbrio de forças, há um deslocamento da superfície do mar à esquerda da direção do vento

Foi este então o fenômeno observado. Matamos a charada!




Respostas ao restante das perguntas iniciais:  

Será que é um tsunami? 
Não é um tsunami! Vimos que foi um efeito meteorológico o causador deste baixo nível do mar anômalo.   
Já aconteceu outras vezes?  
Felizmente há uma série histórica de dados globais de escaterômetros desde 1999, o que permite realizar análise dos períodos em que o campo de vento apresentou características semelhantes nesta região. Alguém habilita-se a colaborar em um estudo?  
Outra forma de encontrar períodos anômalos do nível do mar é analisando os dados de marégrafo. Os registros em Ubatuba-SP indicam sim que houve ao menos outros 04 período anômalos desde 2014:


É interessante notar que no dia 05-out-2014 o nível esteve até mais baixo que o do recente fenômeno. 

Estes registros indicam que é um fenômeno anômalo, mas ocorreu entre os meses de junho e outubro. Será que há alguma regularidade? Uma análise temporal mais longa pode elucidar isto.
Há algo em comum nos processos atmosféricos destes dois períodos?  
Sim! O campo de vento medido pelo escaterômetro registrou fortes ventos de NE e havia a mesma configuração sinóptica, como podemos ver nas cartas geradas pelo CPTEC:



Em ambos os períodos havia um dipolo (Alta e Baixa pressão) com características estacionárias atuando na região. Será que esta configuração somente ocorreu entre os meses de junho e outubro, no mesmo período da anomalia de maré baixa? 

Para saber mais: https://www.youtube.com/watch?v=lnaEmcLE0nA

Sobre Gustavo Prouvot Ortiz

Sou oceanógrafo com experiência em sensoriamento remoto, geologia marinha, Lei do Mar e geopolítica. Vejo o oceanógrafo (bem formado) como um "naturalista moderno", capaz de observar e descrever processos com abordagem multidisciplinar e desempenhar papel relevante em diversos setores da sociedade. Tenho paixão pela divulgação científica e, como pai, creio que somos responsáveis por desenvolver o senso crítico nos pequenos e fazê-los perceber seu papel em nosso complexo planeta.


segunda-feira, 7 de agosto de 2017

XII Semana Temática de Oceanografia - STO 2017


Vem aí uma semana cheia de palestras, minicursos e mesas redondas! Invista na sua formação!



Explorando o Atlântico Sul

A 12ª edição da STO traz como tema o nosso próprio quintal! Venha aprender mais sobre os oceanos, com foco especial no Atlântico Sul! Serão tardes repletas de palestras e mesas redondas, e minicursos nos períodos noturnos. Além disso, cada dia trará um subtema, abordando os principais assuntos da atualidade.

Para mais informações acesse o site: https://www.stoiousp.com.br/

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

O mundo empresarial e acadêmico – como os dois estão relacionados na Oceanografia?

Por Davi Mignac

Ilustração: Joana Ho

Desde que comecei a graduação em Oceanografia, sempre tive um desejo imenso de desenvolver tecnologias e produtos voltados para atender demandas da sociedade. Entender a motivação do meu trabalho e a contribuição que ele poderia fornecer para setores específicos da sociedade foi a força motriz para me especializar em uma área chamada Oceanografia Operacional, focando particularmente na produção de previsões oceânicas na costa do Brasil e na sua importância para os setores de navegação e exploração offshore.

Quando era criança, brincava que eu era o homem do tempo, e apenas olhando para o céu, dizia se iria chover nos próximos dias. Na universidade, relembrando esses tempos, dava risada sobre tamanha ingenuidade, mas começava a me perguntar: como produzir previsões de tempo mais precisas? Por que a previsão oceânica não é tão difundida como a previsão de tempo, e qual a importância dela para setores de navegação e para a indústria? Naquele momento, a universidade era minha “casa” e comecei a criar o espírito empreendedor ali mesmo, ao propor desenvolver um código de computador que melhorava a qualidade das previsões oceânicas geradas para a Petrobras, a qual financia o projeto da Rede de Modelagem e Observação Oceanográfica (REMO). A REMO é um grupo de pesquisa existente na Marinha do Brasil e em algumas universidades, incluindo a Universidade Federal da Bahia (UFBA), na qual me graduei.

No meu mestrado na UFBA, continuei a aperfeiçoar esse código, fiz diversas viagens à trabalho para Marinha do Brasil e para fora do país, incluindo EUA, Europa e até mesmo para China. A REMO abriu minha cabeça para algo chamado inovação, que sim, está presente na universidade e é obrigação no mundo empreendedor. Comecei a circular em um ambiente empresarial, quando durante o mestrado, me tornei consultor da empresa Advanced Subsea, pois eles queriam desenvolver um sistema de visualização de previsões do estado da mar nas bacias petrolíferas brasileiras. Opa, naquele momento percebia que tinha empresas interessadas naquele universo da Oceanografia Operacional. Isso significa que então existia mercado para aquilo, e que pessoas estavam dispostas a pagar por um produto como esse. Então pensei “que maravilha, eu entendo disso, agora só falta abrir uma empresa”.

Terminei meu mestrado, comecei a trabalhar na REMO por um tempo, e surfando uma tarde com amigos do curso, inclusive com dois que já tinham uma empresa de oceanografia,a Preamar Gestão Costeira, começamos a maturar um sistema de risco das operações portuárias com base em previsões hiperlocais das condições de mar e tempo. Não deu outra, abrimos uma empresa, agora a Preamar Soluções em Modelagem. Ficamos todos empolgados com a ideia, e então entramos nesse universo da start-up,  um verdadeiro gatilho nas nossas vidas empreendedoras.

A start-up respira inovação no seu dia a dia, e para ter sucesso, é preciso acreditar, ser criativo, ter ideias e saber moldar seu produto ao mercado. É preciso validar sua ideia com os clientes, é preciso saber se relacionar com pessoas, é preciso saber negociar, é preciso saber precificar, é preciso se acostumar com a resposta “não”, é preciso saber montar uma equipe de profissionais e zelar por ela, é preciso ter estratégia e frieza, é preciso criar uma cultura sólida e transmitir isso ao seu redor, é preciso ser fanático, um verdadeiro “workaholic” - no meu caso mesclado com doses de surf e diversão, claro. Começar a respirar esse mundo foi e ainda é uma experiência sensacional, quanto aprendizado! “Nunca teria enxergado esse mundo se tivesse me fechado completamente na academia”, penso eu agora. Então penso novamente, “deixe de ser ingrato Davi, pois não foi a academia que ajudou a abrir sua cabeça para a inovação? Que fomentou sua busca por coisas novas? Por conhecimento?” Esses dois mundos tem suas peculiaridades, mas são unidos por algo que move o universo das tecnologias: a busca pelo novo, o ritmo de constante aprendizado e o desejo de estar na fronteira do conhecimento. Para inovar, é preciso conhecer primeiro.

E com essa mentalidade, aqui estou eu fazendo meu doutorado na Universidade de Reading na Inglaterra, longe fisicamente da minha terrinha, mas virtualmente conectado com a minha empresa, oras. Reuniões quase todos os dias, planejamento, desenvolvimento, programação, código. Numa start-up, o sócio faz tudo, o famoso “severino quebra-galho”, mas cada um tem suas prioridades, pois para a engrenagem girar, alguém tem que ficar responsável pela área de desenvolvimento, outro pela área administrativa e financeira, outro pela área de prospecção e relacionamento com clientes, e por aí vai.

Vim para o doutorado porque acho que posso aprender mais e com isso contribuir para a empresa da qual faço parte. Posso conhecer o mercado aqui fora também, posso estabelecer contato e parcerias com universidades/instituições de fora. Porque eu acredito que universidades e empresas podem caminhar juntas. E no momento que eu terminar o meu doutorado (mais 1 ano e meio pela frente), devo me afastar da academia no meu dia a dia, mas minha filosofia irá continuar, de que deve existir uma parceria saudável entre universidade e empresa, com ambos se beneficiando dessa simbiose, e girando em torno de um objetivo comum: inovar e revolucionar as maneiras de enxergar processos e conceitos atualmente existentes.

E rapaz, como você segura essa onda de doutorado e empresa? Porque como eu falei acima, eu sou fanático pelo que eu faço, e o sacrifício de hoje é a recompensa que virá no amanhã. Com calma, focado no dia a dia, mas pensando longe. E foi através da minha vivência na academia e na empresa que construí essa visão de trabalho, e do que quero para o meu futuro!

Sobre Davi Mignac:

20370492_1509804612413613_1275167544_n.jpgOceanógrafo, doutorando em Meteorologia pela Universidade de Reading e COO da Preamar Soluções em Modelagem. Fanático pela inovação e pelo mundo das tecnologias. Acredita que a Oceanografia e Meteorologia são áreas de empreendedorismo bem promissoras, e aposta todas suas fichas por aí. A inspiração vem do surf, que como seu trabalho, tem ligação com o oceano. Sempre disposto a aprender, vive seu sonho de um dia se tornar um empreendedor bem sucedido, mas sem nunca esquecer suas raízes acadêmicas.