quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Correntes oceânicas de superfície (Parte II)

Transporte de Ekman, ressurgência, subsidência e circulação de Langmuir

Por Jana M. del Favero


Vimos no primeiro post sobre as correntes oceânicas de superfície (relembre aqui) que a colisão das moléculas de ar do vento com as moléculas de água na superfície do mar resulta no movimento da água, gerando uma corrente. Iniciado o movimento superficial das moléculas de água, elas vão exercer um atrito (uma força) sobre as moléculas de água logo abaixo, iniciando o movimento delas também. Assim, com o vento soprando persistentemente por um longo período de tempo, o movimento vai sendo transferido cada vez mais para baixo na coluna de água. Conforme esse movimento gerado pelo vento vai atingindo as camadas mais profundas da coluna de água, ele vai perdendo velocidade pois aumenta a distância da força motriz (geradora), o vento.
Além de diminuir de velocidade, a direção do fluxo da corrente de água também muda com o aumento da profundidade, como resultado da deflexão de Coriolis. Você deve estar lembrado que no Hemisfério Norte a camada de água da superfície flui para a direita da direção do vento gerador. Do mesmo modo, quando a camada de água superficial coloca a camada de água subjacente em movimento por causa do atrito, a camada subjacente também sofrerá um desvio à direita do escoamento da camada acima dela, e assim por diante: cada camada de água mais profunda é desviada para a direita da camada imediatamente acima dela (lembrando que estamos falando do Hemisfério Norte, pois no Hemisfério Sul o desvio seria para a esquerda). O resultado de todo esse processo de perda de velocidade e deflexão é uma corrente espiralada, chamada espiral de Ekman. Sob a influência de um vento forte persistente, a espiral de Ekman pode estender-se até uma profundidade entre 100 e 200 metros. Apesar de receber o nome de espiral, a espiral de Ekman não se movimenta como um redemoinho formado quando a água desce por um ralo. O termo espiral é usado para  para designar os movimentos horizontais na coluna de água dividida em camadas, sendo que cada camada se movimenta em direção horizontal levemente diferente.
O físico escandinavo, V. Walfrid Ekman, ainda calculou que o transporte resultante na espiral gerada pelo vento é de 90 graus à direita do vento no Hemisfério Norte e de 90 graus à esquerda do vento no Hemisfério Sul. Esse transporte resultante, chamado de transporte de Ekman, representa a média de todas as direções e velocidades da espiral de Ekman. Resumidamente, a maior parte da água desloca-se a um ângulo de 90 graus em relação ao vento gerador.

A espiral de Ekman. 1 - Vento, 2 - Força de cima, 3 - Direção efetiva da corrente 4 -  Efeito Coriolis (Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Ekman_spiral#/media/File:Ekman_spirale.svg)

A influência do transporte de Ekman é importante sobre outros tipos de correntes de superfície, como na
ressurgência e na subsidência. Na ressurgência, por exemplo, um vento soprando paralelo à costa em determinada direção (dependendo do hemisfério), resulta em um transporte de Ekman que afasta a água superficial da costa, aflorando a água mais profunda para "ocupar"o lugar da superficial que foi retirada (já falamos sobre a importância da ressurgência costeira aqui). Na subsidência ocorre o contrário: o transporte de Ekman resultante de ventos soprando paralelamente à costa impulsiona água em direção a linha de costa  e faz com que as águas de superfície sejam empurradas para baixo, ou seja, ocorre um afundamento da água de superfície.
A ressurgência e a subsidência também podem ocorrer longe da influência das bordas dos continentes, em mar aberto. Por exemplo, nas proximidades de 30°N e 30°S as correntes superficiais dos giros de circulação convergem (vão na mesma direção) devido a deflexão de Coriolis, produzindo empilhamentos de água que induzem a subsidência. No equador, por outro lado, os ventos de sudeste e nordeste geram duas correntes superficiais que fluem para o oeste e são desviadas pelo efeito de Coriolis para o norte (direita) no Hemisfério Norte e para o sul (esquerda) no Hemisfério Sul. As águas superficiais locais são então removidas por esse fluxo divergente (em direção oposta), promovendo a ressurgência (a figura abaixo ilustra o descrito).

Convergência e divergência de correntes de água no Hemisfério Norte (Fonte: Pinet, 2014).

É importante ter em mente que o transporte de Ekman é uma resposta para um vento soprando por muito mais do que algumas horas ou até mesmo dias (longo prazo). A curto prazo, ventos que sopram persistentemente e com força na superfície dos oceanos podem ocasionar movimentos verticais na água, fazendo com que o fluxo seja paralelo ao vento gerador e gerando células de circulação longas e estreitas nos primeiros seis metros da coluna de água (com movimentos semelhantes ao de um saca-rolha). As células são chamadas de
células de Langmuir e o fluxo de circulação de Langmuir (veja a figura abaixo). Vocês já devem ter visto no mar o resultado dessa circulação e não entenderam do que se tratava. Por causa da rotação em direções opostas desses “saca-rolhas”, os limites de duas células de Langmuir adjacentes (de dois saca-rolhas) alternam entre fluxos que se encontram e se afastam, enfileirando qualquer material flutuante (como bolhas, manchas de óleo, algas etc) nas zonas de fluxo convergente.

Células e circulação de Langmuir (Fonte: Pinet, 2014)

Assista o filme abaixo sobre a Espiral e o Transporte de Ekman:


Fonte: Pinet, P.R. 2014. Invitation To Oceanography. 7a edição. Jones & Bartlett. Learning. 662 p.

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