quinta-feira, 28 de junho de 2018

Os desafios para chegar até aqui


Ilustração: Caia Colla
Terminando de escrever minha dissertação comecei a refletir sobre todos os desafios pelos quais eu passei no decorrer dos dois anos do mestrado para eu poder entregar esse trabalho redondinho, como se tudo tivesse sido perfeito e fácil de concluir. É uma mistura de sentimentos, pois ao passo que fiquei feliz por ter conseguido concluir mais uma etapa, percebi que esse documento não contava nem um terço de todas as desventuras que ocorreram. Na minha opinião, um dos capítulos da dissertação deveria ser um making-of da pesquisa, só pra contar tudo que deu errado e que você teve que resolver para entregar um bom trabalho.
Para ingressar no mestrado é necessário que, no dia da matrícula, você entregue uma Plano de Mestrado contando qual será o objetivo de sua pesquisa, qual a hipótese e o que você pretende fazer para responder essa hipótese. Nossa, até aqui foi fácil, é simples! Basta você seguir o método descrito que daí os resultados serão tratados, você discute com base em muita bibliografia estudada sobre o assunto e pronto. Em dois anos é tranquilo terminar isso. Quem dera! Pelo menos no meu caso não foi assim…Então vou contar um pouquinho pra vocês das desventuras que ocorreram durante o meu mestrado.
Meu trabalho de mestrado consistia, basicamente, em um estudo comportamental de determinados organismos do plâncton marinho por meio de filmagens em um sistema óptico tridimensional. Para construir esse sistema, eu e mais uma equipe de alunos da pós que também usariam esse sistema nos reunimos e, com base em estudos anteriores, fizemos o sistema preliminar, achando que já daria certo. Foi aí que a novela começou. Com os primeiros sistemas, percebemos alguns itens que não estavam legais como aumento, a cor do LED e a forma como o sistema estava disposto sobre a mesa. Então desmontamos o sistema e montamos outro sistema com as alterações necessárias. Essa última frase pode ser repetida mais 3 vezes, pois a cada nova montagem notávamos defeitos e tínhamos que repensar uma nova configuração do sistema. Até que depois de muitos arranjos e rearranjos e com a ajuda de pesquisadores especialistas nesta parte óptica, conseguimos chegar no sistema definitivo. Nossa, até aqui já se foram alguns meses.
Enfim consegui fazer meus primeiros experimentos. Agora sim, é gerar os resultados e partir para o abraço. Infelizmente, não. Nesta etapa do trabalho eu precisaria filmar as trajetórias que o meu organismo-alvo realizava na coluna de água. O software que tínhamos para que as duas câmeras filmassem ao mesmo tempo travava após 20 segundos de filmagem, o que não era muito representativo para mim. Achamos que era memória do computador, mas mesmo trocando para um computador mais turbinado o software apresentava o mesmo defeito. E agora? Para nossa sorte, nosso laboratório conta com um aluno da ciência da computação que desempenha um trabalho formidável. Para esse problema das filmagens nós trocamos o programa e começamos a utilizar um software que ele desenvolveu. Apesar de não limitar o tempo, esse software não disparava as duas câmeras ao mesmo tempo, então tivemos que utilizar dois computadores. Mas isso era passível de falha humana, pois mesmo que eu tentasse, não conseguia clicar com o mouse ao mesmo tempo nos dois computadores. A solução que encontramos foi utilizar dois microcontroladores que eram disparados por um potenciômetro e então as duas câmeras começavam a gravar ao mesmo tempo. Em meio a todos os testes que íamos fazendo o programa ia sendo modificando de acordo com as nossas demandas. Mais um problema resolvido!
Agora sim é partir para os experimentos. Mas o desafio de trabalhar com organismos vivos é que você depende que o mesmo esteja presente no ponto da coleta. Para meu trabalho, infelizmente, esses ajustes foram concluídos em uma época em que não tinha tantos exemplares para que eu pudesse realizar os meus experimentos. Enquanto isso o jeito era fazer coletas diárias, até que o organismo surgisse e, então, realizar os experimentos. Até aqui vários meses já se passaram, mas eu consegui realizar os experimentos.
Após as filmagens, os vídeos eram tratados por meio de um programa que nos dava como resultado final a trajetória realizada pelo organismo (além das coordenadas e dados numéricos relevantes para o estudo). Mas como esse texto é para relatar as desventuras que aconteceram, você já pode imaginar que alguma coisa aqui também deu errado. Pois bem, o programa que me forneceria as trajetórias do organismo não comportava vídeos tão longos quanto os nossos. Então mais uma vez fomos atrás de nosso “amigo-luz” e ele desenvolveu um software que nos daria a trajetória dos organismos, independente do tamanho do vídeo. Talvez aqui você esteja achando que é fácil desenvolver um programa, mas não é! Ele desenvolve para o objetivo que precisamos, nós testamos, verificamos o que precisa implementar, o que precisa mudar, e por aí vai, até chegarmos no ponto que precisamos e que talvez para outro trabalho ainda esteja sujeito a alterações. Mais um problema resolvido!
Agora sim, tratar os dados e analisar os resultados. Não que esta etapa seja fácil, mas olha quanta coisa foi feita além do que estava escrito no Plano de Mestrado inicial (isso porque contei resumidamente!). Eu não esperava me deparar com tantos desafios. Sabia que não seria trivial, mas também não esperava que nesse período eu tivesse que resolver tanta coisa. Para o mestrado eu precisei ser mais que uma bióloga...aprendi a soldar, fazer ligações elétricas, entender de física, ser técnica de computador, entender um pouquinho de programação e tudo o que foi necessário para que meu trabalho saísse.
Além de tudo o que vai acontecendo, todos os obstáculos da pesquisa, você ainda tem que lidar com sua vida pessoal. Essa parte é complicada! Muitas vezes, por problemas pessoais me senti empacada diante de um monte de coisas pra resolver. Não importa o tamanho do problema, sei que muitos passaram por coisas piores no decorrer de sua pesquisa, mas sendo ela pequena ou grande, é algo que mexe com você e te faz sentir incapaz de avançar (Veja como exemplo nosso post, O que aprendi sobre saúde mental na pós-graduação).
Bem, mas apesar de tudo o que foi contado aqui, eu cheguei ao final do mestrado com o sentimento de dever cumprido. Para mim, é muito importante compartilhar com vocês todas as minhas desventuras, pois mostra o que envolve fazer uma pesquisa...são muitas tentativas, erros e acertos, para no final publicarmos um trabalho lindo, impecável e redondinho. Mesmo com toda a pressão e obstáculos que tive que passar, eu amo o que eu faço e a cada dia tenho mais certeza que fiz a escolha certa, apesar de todos os desafios para chegar até aqui!



E você, qual foi o desafio que você teve que enfrentar na sua pesquisa? Compartilhe com a gente um pouquinho de sua história!

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Curso de Introdução à Biologia Marinha

Você já se imaginou fazendo Biologia Marinha diretamente em campo? 
Esse curso é para você, graduando ou não! Basta amar o mar e querer aprender mais sobre ele e os fascinantes animais que nele habitam.

Local: Ubatuba - SP
Data: 22-23 de setembro de 2018


quarta-feira, 13 de junho de 2018

Salinidade (parte I)

Por Jana M. del Favero


Definição e métodos para a determinação


Uma das características mais marcantes da água do mar é o gosto salgado, certo? E sim, esse gosto é causado por sais dissolvidos na água. Os íons de cloreto (Cl) e de sódio (Na+), juntos, representam mais de 85,65 % de todas as substâncias dissolvidas na água do mar. Essas substâncias são exatamente as mesmas que compõe o sal de mesa comum, já que este é obtido a partir da evaporação da água do mar: a água evapora e o resíduo sólido, ou seja, os sais, ficam no local (veja a figura abaixo). Se somarmos ao Cl e ao Na+ os outros quatro íons mais abundantes - sulfato (SO42–), magnésio (Mg2+), cálcio (Ca2+) e potássio (K+) - a representação vai para 99 % de todos os solutos da água do mar.

     Ao provar diferentes amostras com água do mar conseguimos dizer, qualitativamente (e se você tiver um paladar aguçado), qual amostra é mais “salgada” e qual é menos. Mas essa técnica é subjetiva demais, pois um cientista precisa saber com maior exatidão a quantidade de sal em uma amostra de água, que chamamos de salinidade. Outro método simples de medir a salinidade é semelhante ao método que usamos para obter o sal marinho: deixamos evaporar a água de um recipiente com água do mar e comparamos o peso do resíduo sólido deixado no fundo do recipiente - os sais - com o peso da amostra original de água. Mas este método também não é muito exato, pois alguns cristais de sal se ligam a moléculas de água, afetando o peso do resíduo de sal.

Cartão Postal: Salinas, Cabo Frio - RJ

     Assim, para comparar dados de salinidade obtidos em diversas partes do oceano e medidos em diversos laboratórios e navios, os químicos adotaram uma definição padronizada. Essa definição, que pode parecer bastante complicada, diz que salinidade é a massa total, medida em gramas, de todas as substâncias dissolvidas em 1 quilograma de água do mar, após todos os carbonatos terem sidos convertidos em óxidos, todo bromo e iodo terem sido substituídos por cloro e todos os compostos orgânicos terem sido oxidados a uma temperatura de 480 oC. Como muitos aqui não são químicos nem oceanógrafos químicos, esta definição pode ser simplificada para a massa total, em gramas, dos sais dissolvidos em 1 quilograma de água do mar expressa em ‰ (partes por mil).


      Oceanógrafos especificam a concentração de um soluto (ou seja, de substâncias dissolvidas) em água do mar em uma unidade chamada partes por mil, abreviatura ppt (parts per thousand) ou pelo símbolo ‰. Alguns oceanógrafos também expressam a salinidade como uma unidade adimensional nos termos da PSS78 — Practical Salinity Scale 1978 (Unidade Prática de Salinidade 1978). A água do mar média tem uma salinidade em torno de 35 (ou 35 ‰ ou 35 ppt). Isto significa dizer que os sais correspondem a 3,5 % ( 35 dividido por 1000 e o resultado convertido em porcentagem multiplicando-o por 100) de uma amostra, o resto (96,5 %) é de moléculas de água. Ou ainda, explicando melhor, um volume de água do mar pesando 1000 gramas com salinidade 35 contém 35 gramas de sais dissolvidos.

Uma importante descoberta para a determinação da salinidade da água do mar de forma rápida, acurada e econômica consiste no fato de, apesar da salinidade variar bastante devido às diferentes quantidades de sal dissolvido, a proporção relativa entre os principais constituintes é constante, ou seja a razão entre qualquer par de constituintes principais dissolvidos na água do mar, como Na+/K+ ou Cl/SO42–, é um valor fixo, indiferente do valor de salinidade ser 25, 30 ou qualquer outro. Essa descoberta é chamada princípio das proporções constantes ou composição constante. Graças a ela, tudo que os cientistas precisam fazer para quantificar a salinidade é medir a quantidade de um único íon principal dissolvido em uma amostra de água do mar, pois todos os outros constituintes principais ocorrerão em quantidade fixa proporcional à daquele íon. O íon comumente medido é o Cl, pois é o soluto mais abundante na água do mar e sua concentração é facilmente determinada.

      Atualmente, os pesquisadores dispõem de vários métodos para a determinação da salinidade, incluindo a condutividade elétrica, que é a habilidade de uma solução de transmitir uma corrente elétrica. A condutividade elétrica é diretamente proporcional à quantidade total de sais na água em determinada temperatura. Em outras palavras, quanto mais sais, maior a condutividade elétrica. O salinômetro é um equipamento que permite que os pesquisadores determinem indiretamente a salinidade apenas inserindo uma sonda elétrica na água, simplificando o trabalho do pesquisador se comparado com a determinação química citada acima.

Fonte: Pinet, P.R. 2014. Invitation To Oceanography. 7a edição. Jones & Bartlett Learning. 662 p.